


No dia 19 de novembro de 2008, Maringá perdia o estimado fotógrafo Henri Junior. Embora tenha morrido muito novo, com 28 anos, vítima de um tumor cancerígeno no cérebro, deixou um legado de imagens que, até o dia 15 deste mês, poderá ser visto em exposição. O trabalho está exposto na Câmara Municipal de Maringá, e conta com sete imagens feitas pelo fotojornalista, que trabalhou nos principais meios de comunicação impresso da cidade (Jornal do Povo, Hoje Notícias e O Diário do Norte do Paraná). A entrada é gratuita.
Além da mostra fotográfica, o legislativo municipal batizou uma rua no Jardim Três Lagoas com o nome do profissional.
Quem não foi, ainda tem dois dias para ver a exposição.
Um contra-senso. Acabou por inverter a história. Quando pequena, deitava-me e, religiosamente pedia que minha mãe contasse alguma história. Tinha adoração por Chapeuzinho Vermelho e os Três Porquinhos. Gostava ainda quando ela resolvia, de muito bom humor, inventar alguma narrativa. Ingratidão a dela ao me levar a um lugar chamado escola. Deu-me opções: a pública e a particular. Na cidadezinha onde morava, a última garantia os mimos de cadeirinhas e mesinhas coloridas. O que de nada adiantou, de colorido eu me bastava com minha caixa de Faber-Castell com divinas 48 cores. Optei por mesas e cadeiras normais. O primeiro dia, não esqueço, a novata. Mil rostos fitando-me dos pés à cabeça – não que houvesse muito espaço entre um e outro. Era o ápice da minha meia dúzia de velas assopradas.
Um pecado, largar aquele projeto de gente à mercê da professora e de um batalhão de curiosos. Ainda lembro-me da primeira pergunta: “Você tem cachorro?”. Tinha. A Kika, que infelizmente perdera a vida em um incêndio. Mas não vem ao caso, afinal, o choro entalado na garganta resolvera anunciar a chegada de mais convidadas: lágrimas e lágrimas rolando pelo meu rosto – que nunca imaginara receber, futuramente, visitas periódicas da tal de Acne. Enfim. Chorei. Chorei. E passei as horas seguintes em uma salinha especial. Não entendia porque a salinha era especial e, anos mais tarde, descobri o que era síndrome de down - a rima forçada não fora de propósito, perdão. Todos tinham direito de aprender, e eu, obviamente, de chorar.
Desesperada ao ouvir o que a diretora relatava. Que conduta terrível da menina, anti-social. Fechamos um acordo com a bibliotecária: eu iria me juntar aos outros de mesma idade, à contra gosto, mas a oferta era válida. Poderia dali em diante, emprestar quantos livros eu quisesse daquele lugar mágico que me acolhia tão bem. Meus primeiros passos na literatura, quem sabe. Sorte minha que consigo lembrar, ainda em detalhes, do pior dia da minha vida. Esbaldava-me em casa com tantas figuras de coelhinhos, ratinhos e bonequinhas. E dizeres curtos, porém, tão significativos.
Hoje, ironicamente, me peguei lendo crônicas recém adquiridas para minha mãe. Antes de dormir. Nada comparado a chapéus ou porcos. Quiçá, camelos e agulhas, aniversários de crianças ou domingos de sol. E, de muito bom humor, entoava algo que anos mais tarde viera a aprender a gostar e escrever: crônicas. Hora de contar histórias e dormir.
Apareço quando a pessoa menos deseja. Aliás, sou muito criticado. Meu teto é de vidro e meu pavio... Bem, que pavio? Não gosto de dividir atenção. Sou egoísta e sei disso. As pessoas hesitam ao me identificar, e muitas mentem a meu respeito. Escondem-me como se eu fosse motivo de vergonha e, muitas vezes, sirvo de pivô para muitas brigas. Não queria ser uma sementinha de ódio plantada na relação entre as pessoas, mas acabo servindo tal função quando bem entendem. Meu intuito era proteção, alerta e um bocado de manha.
Infelizmente, usam-me como desculpa para se livrarem de quem já não interessa mais. Atribuem significados aos bens materiais e me jogam na fogueira quando alguém pede qualquer objeto emprestado. Impossível eu, na idade que pouco me importa, ser tão ruim assim.
Acho cômico quando esses humanos resolvem me evitar. Negam-me a razão, quando sei o que estou fazendo. Quando não querem admitir a si mesmos o que sentem por outrem. Considero minha principal diversão, se queres mesmo saber. Fico pouco em evidência para dar show quando resolvo aparecer. O que, dependendo da situação, faço com frequência. Aí recorrem aos tais psicólogos para controle emocional. E botam a culpa em mim. Logo eu, que só atiço. O real responsável pelo circo pegar fogo são esses daí, que me rejeitam a qualquer custo.
Eu existo, e isso é fato. Ponto. Nunca deixarei de existir, enquanto a possessão for componente do perfil das pessoas. Ter-me ao lado é comum, não sou doença. É que, na verdade, ninguém consegue compreender minhas reais intenções. Gosto de testar limites, de gente que saiba me dominar. E quando isso acontece, ah meu amigo, fico manso, manso.
Eis meu segredo, de domínio e dosagem.
Desculpe-me, não me apresentei ainda. Mas imagino que já tenha ideia de quem seja, pois provavelmente já participei ou ainda participo da sua vida. Posso até ser tudo isso que me pintam, mas jamais mal educado.
Muito prazer, meu nome é Ciúme.
O tempo dela, mal sabia, estaria a chegar. Não era possível dizer se era mimada demais para aceitar que nem todos a tratariam da forma a qual tratava os demais, mas via-se que tinha consciência de que sofreria além da conta por agir de tal forma. A imaturidade ainda se fazia presente na pouca idade e na falta de experiência do acúmulo de anos. Não sabia lidar com certas situações.
A recompensa pelo esforço – pensava - raramente vem, que dirá o reconhecimento. Está em falta no mercado, tão saturado de egocentrismo. São verdades que enfrentava, ainda que com o apoio dos amigos, faltava-lhe o aval de quem a moldara a ser quem se tornou. Ou no que se tornaria. Não caberia a ela, nem a Freud explicar o posicionamento brusco do Mestre. De como ignorava as vitórias e a fidelidade daquela que seguiria seus passos. Não demonstrava interesse e, proferir uma palavra de estímulo, era afrontar o dom que recebera. Que agora aparentava não ser mais o de ensinar e acompanhar justamente aqueles que se esforçavam para alcançar alguma plenitude no espaço de atuação. Teatral.
Ela segurava o relógio, pois sabia que a hora estava chegando. Nunca se dera conta de como esse tipo de situação poderia afetá-la. Não sabia dizer se fora pelo sentimentalismo aguçado ou pela mágoa atribuída à desanimadora indiferença. Como podia ser uma pessoa com duas personalidades completamente diferentes? Na frente dos demais, misógino. No mundo, deleitoso. E deleitava-se. E machucava, destruía e não se importava. A realização não lhe pertencia, ele que já tinha tudo o que gostaria de ter.
O acúmulo nas decepções aglomerou-se instantaneamente, ao ver a atenção redimensionada a qualquer produção mal feita. Desfez-se de todas as crenças, pôs fim à magia e brincadeiras. E sabia que era chegada a hora. Correu escadaria abaixo, mal sabendo que era observada.
- Você tá chorando?
E pulou, sem pensar duas vezes, rolando, rosto abaixo. Uma lágrima de desgosto. O tempo acabou. Não conseguiu responder.
- Não acredito que você tá chorando por causa disso. Me diz que não, vai.
Ela ria, enxugando o rosto com as costas da mão gelada. Que tremia.
- Não sei se rio ou se choro.
E os dois riram.
Ela foi embora, pensando em como foi infeliz ao acatar ordens de quem não se importava. Resolvera que era hora de libertar-se, pensar sozinha e reconhecer-se. E chorou. Sorriu. Adormeceu. Amanhã teria de caminhar com as próprias pernas.
E o tempo recomeçava...
12 de outubro, Dia das Crianças. Passou sem qualquer significado. Até qual idade podemos considerar uma criança de fato “criança”? Não sei. Há quem diga que a criança nunca morre - se esconde. A minha criança foi substituída por movimentos robóticos. Infelizmente.
Acordar, café, trabalhos, almoço, trabalho, café, faculdade, café, ônibus, livros, cama. Sem sonhos. Programação mecânica, envolta pelo tédio, pela mesmice, pela ausência de cor. Disseram-me que meu perfil era de extremos. Resolvi que crescer funcionaria bem, quando a criança aqui dentro anseia pelo retorno. A mesma que atira as memórias de um tempo bom, espontâneo. De atividades maleáveis, flexíveis. Agora, que sou? Parte do conjunto, peças de metal. Que hora ou outra precisará ser trocada.
E que falta faz? Sem vida, segmentada, obediente. Componente perfeito de um modelo seguido por tantos. Vazio.
Tudo exatamente igual, as mesmas repetições, a mesma nota soada tantas e tantas vezes, agora inaudíveis para que alguém possa ouvir. O grito de desespero, o choro sufocado pelo cotidiano. O cansaço agarrado às olheiras, o combustível agora com gosto de diesel. E o dia das crianças já passou.
Significação para quem atribui, para quando faz sentido. Sequer a data do aniversário fez sentido, comemorar ser criança? Deveria ter libertado, por um instante, a criatura já travada, destinada ao esquecimento. Deveria ter. Tanta coisa.
Mas muito tinha de ser feito, descomemoração, desaniversário, desalimentada, desacordada. Ao contrário. Sempre igual. Diferente.
Acorda!
Reformulando: quando a qualidade da didática é questionada. A metodologia engessada de despejo do conteúdo nas mentes de alunos que fingem aprender uma verdade absoluta é, definitivamente, algo que deveria ser extinto na docência. Há verdades que não mudam. Será? A ciência é posta em prova a todo instante, e novas formulações e embasamentos são descobertos e derrubados a todo o momento em que alguém se dispõe a ir mais longe ao conteúdo explorado.
Ok, não vou falar de métodos de ensino, pois não tenho aval algum para dar pitacos a respeito. Só contextualizo uma opinião que tenho vivenciado e que, de certo modo, associa a experiência do profissional com a maneira de ensinar. E isso resulta em diversos pontos positivos, que ultrapassam a compreensão delimitada pelas paredes da sala de aula. O bate papo, mesmo que sem ligação direta com o assunto discutido, por vezes resulta em uma consequência positiva. Estimula o pensamento e a própria definição das ideias acerca do que nos rodeia. É esse o ponto. Conseguir parar e, por um instante, pensar em possibilidades, em teorias - e viver daquele fragmento utópico de que os 110 minutos de suposições e hipóteses valem cada segundo esticado da sexta-feira. Ou de qualquer outro dia.
É difícil falar de todos àqueles que me ensinam algo. Todos conseguem ensinar para os que se dispõe a aprender. Outro ponto. Escutar e discutir. Apreender funções, histórias, experiências, vivência. Definir como conteúdo o que material algum poderia transpassar. Admiração. Não consigo definir a sensação abstrata de estar em contato com pessoas que direta ou indiretamente contribuem para a formação dos meus ideais, da minha postura. É difícil falar de todos de uma só vez, pois cada um tem uma característica singular que, somada ao todo, reconstroem as minhas crenças, apontam para novas alternativas. Sugerem outro olhar. Atiçam a observação e, principalmente, a atenção.
E cá permaneço, perdendo algumas horas de sono da minha sexta-feira, tentando escrever algo que nem eu sei bem o que quero dizer. Partindo do nada e querendo chegar a lugar nenhum, só para manter o complexo hábito de pensar. Nem sempre sentimentos são materializados em frases ou imagens. Definir em palavras não expressaria ao certo tudo o que cabe aqui dentro. Gratidão.
Só poderia render algum devaneio.
-
Cadê a réplica? Da coisa, do sonho, do encanto e fadiga.
Quero a resposta. Que me incomoda, aflige, atinge, tinge e descansa no pensar.
Incômodo algum! Eu diria.
Perguntas. O que será, foi, fui, jaz. É.
Questão de tempo. Acanha, tormento, atormenta, engana e faz.
Pensar. O que quero, agora, não sabe e só.
Solidão. Escura, fria, vazio que ecoa.
O medo.
A verdade.
O momento.
Sorriso. Gargalha, alegria, sente.
O fim.
Fim.