quinta-feira, 28 de julho de 2011

Feliz aniversário!

E então você apareceu. Assim, de repente. Nem pude pensar muito para agir, ou então não teria coragem o suficiente para continuar. Eu nunca fui muito segura a esse ponto, externar minhas emoções assim. E você sempre tão compreensivo, atencioso. Até quando eu me distanciava de ti, sabia que ainda estaria ali para me dar apoio.

Correspondeu-me de pronto. Foi fácil. Mas não achei que seria complicado manter toda essa sensação por muito tempo. Surpreender é complicado. Exige criatividade. Eu precisava corresponder à altura do que você representava até então. Quando eu precisei desabafar, você absorveu cada palavra minha. Lágrimas, sorrisos. Boa parte da minha existência.

Ser sentimental pode ser um problema. Ser sentimental demais então, impossível lidar. E você soube com uma sabedoria incrível. Sempre mudando a aparência até me agradar, comemorando a cada nova conquista, a cada novo comentário positivo sobre nós. A cada pessoa que parava para olhar.

Cada minutinho, cada visita que recebíamos. Você que sempre esteve tão longe, do outro lado, agora era convidado a entrar. E compartilhar da minha vida. E guardar todos os momentos, registrar não só a minha história, mas a de quem quisesse. Agora éramos nós.

Pode ser que um dia isso acabe. Eu me canse, você perca o brilho, o interesse seja outro. Mas eu vou lembrar quem me deu base para externar o que antes estava engavetado. De quem me ajudou a driblar o medo da crítica. Da falta de aceitação. Melhor: de quem me fez aceitar que eu podia compartilhar aquilo que mais gostava de fazer.

Escrever.

Dia 28 de julho fez exatos dois anos que você passou a existir.

domingo, 24 de julho de 2011

Liga ações

Esse silêncio é minha agonia. Será que falei demais? Fiz tudo errado. O que era pra ser? Por que é que eu nunca consigo ficar quieta? Ou falar a coisa certa? E essas horas iguais? Que brincadeira mais boba. De nada significam, mas só querem significar... O tempo tá passando.

Esse silêncio é minha agonia. O que ele estará fazendo agora? Em casa, na rua, nos meus pensamentos? Onde é que eu estou agora? Será que tenho onde morar? Tenho um espacinho ali, naquela vida? Mas é tão simples: o telefone está me encarando há horas. Será?

Tateio as teclas. Vejo o plano de fundo. Desligo. Não.

Esse silêncio é minha agonia. Volto a ligar o aparelho vermelho meia hora depois. Será que ligo? E vou falar o quê? Ainda bem que pelo telefone ninguém pode ver meu rubor. Eu nunca fui assim. Alguém pode me dizer o que está acontecendo? Eu deveria reconhecer o que há, mas não o faço. É diferente. Ligo?

Horas iguais.

Esse silêncio é minha agonia. Vou dormir. Mesmo sonho. Cinco sonhos. Mesmo protagonista. Será possível? Acordo. Que horas são? Mais uma vez, iguais. Dá pra parar? Eu me conformo? Pego o telefone nas mãos, elaboro um discurso mental – o que eu diria? Manter um diálogo com a respiração ofegante não seria possível. Mentir que a gripe me deixou sem voz também não dá. “Ah, liguei por engano, desculpa”. Ledo engano.

Agonia. Agonia. Agonia.

E agora? Que martírio. Que silêncio. Que sensação ruim. Por que ligaria? Ouvir aquela voz mais uma vez seria um reconforto e tanto. Que coisa besta, ficar feliz em ouvir a voz. Um “alô” qualquer. Liga para qualquer pessoa. Manda uma mensagem, então. Não sei o que mandar. Claro que sabe. Não. Por que não liga? Medo. Tenho medo.

Esse silêncio é minha agonia. Vou ficar quieta. Vou ficar no meu canto. Vou ficar por aqui. Não. Vou ficar pensando, pensando e pensando. Vou ficar querendo, e tentando. Vou ficar perturbando quem não merece. Tá tarde. E daí? Liga! Não vou ligar. Mas você liga tanto pra isso, então liga! Eu me importo demais para ligar.

Agonia. Tá se fazendo de difícil? Não é isso. Ele pode pensar que você não liga. Mas eu ligo, ligo sim. Então o que está esperando? O tempo tá correndo, tá voando. O que tem a perder? Por que é que eu pondero minhas ações? Eu deveria ligar. E perguntar se está tudo bem. O que é que ele está fazendo. E ouvir aquela risada. E ficar feliz com o “Hey” no lugar do “Alô”. E eu faria uma voz feliz, e tentaria disfarçar meu constrangimento.

Tudo está tão quieto. Eu não deixaria espaço para o silêncio. Nem para a agonia. Eu falaria qualquer coisa que viesse em mente, só para ouvir qualquer resposta em troca. Só para me perguntarem se eu teria bebido qualquer coisa com álcool. E me faria de boba. De desentendida. Fingiria bem, muito bem. Sou perita nisso. Eu não ligo. Por que é que você não toca?

Esse silêncio é minha agonia.

sábado, 23 de julho de 2011

Exercício

- Cê tá amarelo. Você tá bem?
- Amarelo porque anseio
- E fica aí, apreensivo
- Estático como uma árvore
- Agora tá ficando azul
- E você branca, igual papel
- Cachorro! Igual ao cachorro!
- Tal qual a calma, a paz
- Levanta, sai da calçada
- E sento onde? No canteiro?
- Nessas cinzas, de cigarro
- Nesse cinza de concreto
- Nessa creche, nesse inferno
- E vive o devaneio
- Transpassa a faixa, o barulho, o branco e o cinza
- E chega na praça
- Atravessa com pressa
- Não repare no sinaleiro
- Não nota. Anota. Se esconde por entre os tapumes
- Atravessa. Que tá verde.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Estrada, caminho e abraço

Segura teu abraço
No meu braço
Que tô chegando
Pego a primeira mala
O primeiro bonde
Atravesso o oceano
Pra me livrar daqui
Pra te ver por aí
Como se toda distância
Coubesse num abraço

Apertado

Acolhe

Recolhe

Manifesta

Abraça!
Tô chegando!

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Baque seco

E um barulho, rasgando a tarde silenciosa daquela rua entremeada por avenidas, chama a atenção da secretária a fazer suas ligações. Naquela solene tarde em que o sol resolvera dar as caras. “Ó o calor aí outra vez”, exclamou fulano ali, na mesa ao lado.

Reunião, confirmar presença, remarcar viagens e atender prontamente a qualquer solicitação. Da janela via, e ouvia aquele barulho que atraíra a atenção. Um baque seco faltou ao final do grito vindo da freada brusca. Ninguém o vira, a não ser a neta.

Bem ali, naquela esquina do cachorrão. O relógio marcava quatro horas e vinte minutos de uma tarde de terça-feira. Qualquer terça-feira. Dois motociclistas cortaram caminho através da vida de outrem, e agora era tarde. Um gol vermelho ligou o pisca-alerta uns dez metros a frente. Ninguém o vira.

Olhando mais atentamente, entre uma ligação e outra, aquele senhor deitado ao chão ainda úmido. A cabeça avermelhada, o sangue formando caminho por entre as folhas secas na calçada. Meio corpo na faixa de pedestre, meio corpo ao meio fio – que escorria por toda ruela até então entediada.

Levantou-se de pronto, aos pedidos escandalosos da neta. Alívio de quem presenciara, incluindo o moço do gol vermelho – já que as motos foram-se. O dedo a altura do rosto, e um discurso de qualquer pedestre inconformado com o desrespeito. “É a sinalização, meu filho!”. Mas a culpa não fora dele. Ouviu calado, cabisbaixo.

“Vamos vovô, vamos”, insistiu a pequena. Acabara de sair do colégio, já havia chamado a atenção de todos os colegas. A ambulância estacionou ao lado, os cuidados começaram com o sangue empapando os cabelos esbranquiçados, enquanto o bigode se mexia, freneticamente, como se pertencesse a um roedor.

O jovem entrara no carro, ainda de cabeça baixa. A movimentação caiu e o telefone continuava a tocar. O sol batia sonolentamente pela janela, mesclando um vento que trazia aquela constipação típica dos desavisados – ah, essas mudanças climáticas! A poça ficara ali, escurecendo.

Outro baque. Seco.

terça-feira, 5 de julho de 2011

Relativo

- Vocês ficaram?
- Não – disse, fitando o próprio pé.
- Vocês estão juntos?
- Não – repetiu, sem movimentar qualquer parte do corpo.
- Diga isso olhando nos meus olhos!
- Não. NÃO! Satisfeito?
- Não. Você gosta dele.
- E se gostar?
- Não existe “e se”, é simplesmente visível. Só você não percebeu.
- Quem disse que não?
- Então porque tenta esconder?
- Por tudo que já respondi. E que é verdade.
- Então pare de fantasiar. Criar uma realidade que não é sua. Pra quê fazer isso?
- Pra viver.
- Eu ainda não entendo.
- Deve ser terrível viver todos os dias sem sentir o coração acelerando.
- Isso não é viver, é morrer todos os dias.
- Isso responde tudo que você precisava saber.
- Mas você gosta de algo que não existe.
- Existe, para mim sempre existiu e sempre vai existir. Eu o criei.
- E acredita em algo que não existe. Ele não vale a pena.
- Essa é a sua conclusão.
- É a verdade. Não vê? Vai te machucar.
- Eu não me importo.
- Eu ainda não entendo. Por quê?
- Porque já faz parte de mim.

sábado, 2 de julho de 2011

A arte de conversar sério

- Eu vou ficar bravo com você
- O que eu fiz?
- Eu estou bravo com você
- E não vai falar o motivo?
- Não é bravo, é chateado
- Mas me conta... Por favor!
- Ah, você sabe o porque...
- Sei, mas quero ouvir de você
- Você tá obsessiva
- Isso é ciúme?
- Também. Mas você continua obsessiva...
- Claro que não...
- Dizer “eu te amo, seja feliz”, é amor. Gritar “eu quero!”, é obsessão
- Não, é “O Segredo”
- risadas -
- Não creio nisso... Você não existe
- Viu? Não é obsessão.