domingo, 23 de outubro de 2011

Café com leite

Daqui alguns anos me vejo realizada. Plena. Feliz. Não mais cautelosa. Não mais amedrontada por qualquer apontamento de dedo alheio. O amadurecimento ou o distanciamento faz isso com a mente: faz bem. Bem pra pele, bem pro sorriso, bem pro corpo. Pr’alma.

Talvez eu tenha montado aquele cafezinho aconchegante. Baseado no que eu vi uma vez em Cianorte, um misto de café, livros e legião urbana tocando ao fundo. Encontro de casais, fotos antigas grudadas na parede. Fotos minhas. Momentos meus. Compartilhados. Porque é a felicidade que me acontece. É o que tudo caminhava para ser: serei. O que sou. Uma lapidação melhor e maior do que hoje é incompleto.

E você vai entrar por aquela porta. Vai me cumprimentar com um aceno de cabeça, um sorriso de lado, o mesmo olhar perdido e apaixonado. E eu nunca saberei pelo quê. Pedirei para que te atendam como realmente merece. E você virá acompanhado do teu sossego, da sua falta de pretensão. Eu virarei as costas para anotar o pedido e darei o melhor sorriso que tenho guardado no peito. Que é só seu.

A porta vai se abrir, a campainha vai tocar avisando que mais alguém entrou. Junto de novo cliente, uma cortina de vento gelado, porque o clima aqui ainda não mudou: continua maluco. Às vezes quente que não me cabe o calor, e me falta o ar, a visão e o bom senso. Outras, bem frequentes, vêm acompanhadas com o que combina bem com o céu: marrom, bem gelado.

Podia ser um cappuccino. Podia ser um café tradicional. Um carioca, macchiato. Aprendi esses dias a fazer latte art. E desenhei, como uma criança que brinca com uma caixa de lápis de cor 24 cores da faber castel. E brinca escondida porque não pode brincar na frente dos outros: as aulas ainda nem começaram. Fiz um coração. Tímido, como eu era naquela época. Como ainda guardo um pouco de mim no que restou. No fundo da xícara. Daquele calor que acabou.

Faço questão de levar à mesa. Você agradece, empunha um jornal e começa a ler. Não perdeu o costume. O legião urbana ainda toca. Você levanta. Paga, despede-se e vai embora. Como se fôssemos meros conhecidos. De uma eternidade de lembranças que não conseguimos esfriar. Do café que ainda nos une ao acaso. Do tempo.

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