quinta-feira, 4 de março de 2010

É meu.

Você já teve a sensação de reconhecer algo que lhe pertencia em outras mãos? É tão estranho, não é? A impressão que tenho é um filho que me foi arrancado e nem se deram ao luxo de mudar o nome. A minha identidade ali estampada. Ora essa, saiu de mim, não saiu? Cada texto, cada foto, cada detalhe que emana de mim, penso que me pertence.
Adoraria que na prática essa teoria funcionasse. Ela poderia se aplicar tão bem, em tantos contextos diversificados. Mas sei que não é bem assim que as engrenagens funcionam. E como agregamos valores, não é? Nascemos no zero, vamos aderindo o que nos convém – é disso que formamos opiniões que dizemos ser nossas. Apropriamo-nos de tantos dados alheios, formamos um perfil nosso e ainda lutamos por sua legalidade e exclusividade.

Certa vez, conversando com meu irmão, ele disse algo que eu realmente parei para pensar – não somente aquele dia, pois as palavras sempre brotam em minha mente. “A partir do momento em que escrevemos e divulgamos a nossa palavra, ela deixa de ser nossa”. Sabe, será que ele tem razão? Damos a cara à tapa, tiramos segredos da gaveta e mostramos para os demais que estamos aqui, que sentimos. Por vezes, expomos nossa criatividade, nossos deslizes, nosso verdadeiro perfil tão camuflado em palavras bonitas. E mesmo assim, estando abertos a críticas e elogios, nos deparamos com a brutal falta de consideração em ver palavras que saíram bem eu sei de onde, simplesmente por aí, sem nome e endereço, sem dono.

Apropriando-se da fala alheia. Imagino tantas vezes os ossos revirando nas tumbas dos nossos mestres da literatura brasileira, por, de modos tão diferentes terem o seu trabalho menosprezado. Terem seu tempo ali dedicado escarrado e sem identificação. Tenho pesadelos com textos em que os autores têm o nome trocado, a ideologia confundida. Composições plagiadas, descaradamente, copiadas sem o menor pudor.

A palavra é realmente nossa? Tudo que emana da nossa mente, de nossa boca, de nossas mãos, nos pertence? Ora, se eu pinto uma tela intencionando vendê-la, deixo de fazer arte pela arte e converto os valores artísticos em dotes consumistas, confere? Mas a tela continua sendo minha? Tem meu nome assinado ali em baixo, mas está sob o poder de outro dono agora. Continua fazendo parte de mim? Com o tempo – ah, ele de novo! – eu até posso esquecer as cores, o enquadramento fica em escala de cinza, eu esqueço o que fiz e em que gastei o dinheiro recebido pelo trabalho que me custou algumas horas pensando no que poderia fazer com as consequências da arte. Assim funcionam as palavras? Pensando por essa vertente, eu não escrevo por ganha-pão, embora seja um objetivo pessoal que pretendo alcançar. Dói mais ainda pensar dessa forma, porque podemos dizer, de fato, que elas me pertencem. Saíram do meu íntimo, naquele momento de clarão onde tudo faz sentido. Correram em minhas veias, atravessaram minhas pálpebras, estremeceram os meus dedos. Foram assassinadas. Trocadas por outras que foram mais coerentes. Surgiram e esvaíram-se tão depressa. Ah, as palavras eram minhas sim. E não fiz por dinheiro, por mérito, para desengavetar. Simplesmente fiz porque gosto, porque aprecio. Amo. Bem, tenho prazer em realizar um trabalho que me faz bem, o qual o único pagamento converte-se em elogios e críticas.

Aí questiono: meu irmão, você tem certeza que não mais me pertence? Nos pertence? Talvez meu posicionamento seja pra lá de egoísta e sem sentido. Talvez seja uma luta sem vitória prevista. Mas lhe digo, maninho, que uma mãe jamais esquecerá o filho que teve. A dor e delícia de criá-lo da maneira que o vê, o sente e o transforma. O mérito de educação jamais será posto em prova, mesmo que o sobrenome seja estilhaçado, mesmo que haja criações de má fé, mesmo que as réplicas indiquem o contrário. É meu, e vai continuar sendo.

5 comentários:

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  2. Seu último parágrafo me marcou. Minha mãe pensasse desta forma, nossos conflitos estariam evitados. Ótimo texto, como sempre.

    Um beijo! ;)

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  3. olá, gostei muito de seus textos...reflexivos, estimulantes, profundos e às vezes doídos..tb tenho um blog canto do desabafo...dá uma passada por lá bj

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  4. Então, plágio é mesmo uma tristeza, né? Você viu que a garota excluiu quase todos os posts dela, tadinha? iUAHSIOUHAIUSH

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  5. Ana Luiza,

    Dias atrás pedi sua autorização para publicar um conto seu e recebi no meu e-mail uma resposta. Acho que fui enganada, Já retirei a postagem.
    E-mail que recebi foi de analuizaverzola@gmail.com

    grata
    Adriana

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