domingo, 4 de outubro de 2009

Previsão

Um telefonema na noite de sexta bastou para incidir o desespero em meu humor, até então estável. Um maço de cigarros e uma noite em claro não bastaram para aliviar o sofrimento antecipado. Vi o dia chegar, tímido, anunciando a manhã cinzenta de um sábado que eu desejaria não vivenciar.
Esperei o despertador informar que era hora de levantar. Tomei as chaves do carro em minhas mãos já abatidas pelo passar dos anos. Peguei o elevador, fitando aquele estranho no espelho – como a marca da idade perfurava cada vez mais meu rosto! Passei as mãos pelos cabelos, que embora volumosos, tinham uma porcentagem incrível de fios prateados. A essa altura, será que me faltava alguma coisa para conferir?
Atravessei a portaria murmurando um bom dia. O que fez o porteiro, em meio a um bocejo, responder qualquer coisa, voltando a encorujar-se na cadeira. Adentrei o automóvel e observei a névoa brincando com aquela rua tão vazia. O ruído do motor fez alguns dos pássaros preguiçosos levantarem voo e então, rumei para minha vida – herança de meu pai - ver de perto a catástrofe que a ligação do dia anterior havia anunciado. Sempre fui um homem do campo, tal qual meu genitor.
Quarenta minutos de carro passaram sem que eu notasse todas as histórias que se infiltravam pelo retrovisor. Ao mesmo passo que eu ansiava chegar, queria ir pelo lado oposto. Fugir da situação sempre me pareceu uma saída viável, até eu ter certeza de que precisaria conferir os fatos. Avistei a estradinha de terra fazendo curva na casa de tijolos que me confortava durante a semana. Caminho tortuoso e enlameado. Notei algo diferente do que meus cansados olhos se habituaram a ver todos os dias.
A árvore fronte a varanda jazia ao chão como um pedido de desculpas. O telhado, amedrontado, fugira. Os grãos, que precedente a tempestade foram cuidadosamente plantados, colhidos e ensacados, já não serviriam de testemunha para o que eu presenciava. Antes que os empregados acordassem, conduzi as rodas realçadas pelo tom da terra, pela cor do sangue, em direção ao ponto de partida da notícia avassaladora. Era um pé vermelho, sabia bem.
Desolado, já não conversava, mal comia. Pudera, vi minha vida destroçada logo cedo – mesmo horário que me recolhi e a muito custo, adormeci. Desejei que tudo não passasse de um pesadelo com raios e relâmpagos, até que um barulho ao fundo do sonho me fez sair do inconsciente – nitidamente o estrondo não era um trovão, nem um aviso prévio da chuva agendada ao longo do final de semana. Reconheci o som semelhante ao telefone ecoar aos meus ouvidos já afetados, tanto quanto meus cabelos esbranquiçados.
- Interfone! – pensei. Em um sobressalto corri atender, o que teria acontecido agora?
- Bom dia! Seu Sérgio? To com o jornal de hoje aqui, viu o que aconteceu na região que o senhor tem propriedade?
Jurava que era fruto da quimera. Permaneci em silêncio remontando os acontecimentos daquele final de setembro.
- Vou mandar pelo elevador, o senhor quer dar uma olhada?
- Não posso. Não posso pensar na cena que visualizei e que é real.

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